Posição da UGT sobre as alterações ao Código do Trabalho CPCS de 13 de Maio de 2014 – Negociação Colectiva
A UGT regista as propostas apresentadas em sede de concertação social, as quais pretendem operar uma alteração ao Código do Trabalho, visando de novo uma alteração ao quadro existente para a negociação colectiva.
A UGT não pode, antes de mais, deixar de reafirmar que considera que as alterações em matéria de legislação laboral não são prioritárias, na medida em que sempre considerámos que estas não estão entre os factores que mais efectivamente potenciam um reforço da competitividade.
A necessidade de novas alterações foi aliás afastada em momentos anteriores pelo próprio Governo, reconhecendo de alguma forma a desejabilidade de um quadro legislativo estável para o normal e regular funcionamento das relações de trabalho e para o fortalecimento de um quadro de confiança, essencial para o seu desenvolvimento.
Por outro lado, devemos ainda questionar a sua pertinência num quadro em que, a fim de dar cumprimento às imposições do Memorando de Entendimento, foram acordadas tripartidamente – no contexto de um compromisso global, até hoje desequilibrado na sua implementação – um conjunto de alterações, designadamente em matéria da negociação colectiva, algumas das quais com efeitos muito penalizadores para os trabalhadores.
Tão mais necessário se torna questionar a pertinência das propostas apresentadas se considerarmos que a negociação colectiva se encontra em níveis historicamente reduzidos, quer em número de convenções quer de trabalhadores abrangidos, e que o que importa ter presente nesta discussão será a necessidade urgente de promover a dinamização dos processos negociais, conforme resulta aliás do referido acordo tripartido de 2012.
A UGT tem ainda presente que estas são alterações que resultam de alterações ao Memorando de Entendimento negociadas unilateralmente pelo Governo com a Troika, sendo que a sua discussão com os parceiros sociais se encontra a ser realizada tardiamente, pelo que devemos questionar qual o real grau de abertura para que as mesmas sejam negociadas.
A UGT regista positivamente a proposta apresentada de alteração à Resolução do Conselho de Ministros relativa aos critérios de emissão de portarias de extensão, sobre a qual, em parecer já emitido, e apesar de considerar que a questão de fundo de ser necessário retomar plenamente o quadro estabelecido pelo Código do Trabalho, reconhecemos que se vêm minorar os efeitos extremamente negativos das disposições em vigor.
A UGT reafirma a sua disponibilidade para o diálogo e a construção de compromissos mas deve deixar igualmente claro, como aliás o fizemos em sede de CPCS, que algumas das propostas apresentadas se nos afiguram inaceitáveis, não apenas pelos efeitos negativos que terão sobre as legítimas expectativas dos trabalhadores, sobre os sindicatos e sobre a negociação colectiva, potenciando insustentáveis vazios negociais, mas ainda pelas dúvidas de constitucionalidade que suscitam.
Por fim, devemos ainda reiterar aqui aquela que sempre foi a nossa posição de princípio relativamente a uma matéria que consideramos urgente e prioritária: a da actualização do salário mínimo.
A UGT há muito que vem defendendo a necessidade de aumento imediato do salário mínimo, a qual se encontra fundada não apenas nos efeitos positivos que teria na economia e na vida dos trabalhadores, mas igualmente em razões da mais basilar justiça social.
Devemos aqui deixar claro que esta reivindicação da UGT nunca estará na dependência de quaisquer consensos a construir noutras matérias, como aquelas que são agora objecto de apreciação.
Foi aliás nesse sentido que o Secretariado Nacional da UGT decidiu por unanimidade no passado dia 7 de Maio de 2014, em resolução que agora parcialmente reproduzimos:
“É essencial que o Governo assuma as suas responsabilidades nesta matéria, não se escudando na conveniência de um consenso prévio dos parceiros sociais, nem na tentativa de englobar esta discussão num quadro negocial mais lato.
Esse consenso é de facto desejável, mas nunca foi condição para que o Governo cumpra plenamente o seu papel. Estamos convictos que um aumento imediato do SMN para os 500 euros não conheceria a oposição de qualquer dos parceiros sociais, de tal forma é generalizado o reconhecimento da sua pertinência económica e social.”
Prorrogação da suspensão das disposições da negociação colectiva relativas a pagamento e descansos compensatórios por trabalho suplementar
O Governo vem apresentar uma proposta de prorrogação da suspensão acordada tripartidamente em 2012, cujo termo se verifica a 31 de Julho de 2014, no sentido de a mesma vigorar até ao final do corrente ano.
Antes de mais, devemos salientar que esta suspensão foi acordada num contexto substancialmente diverso do actual, mas em que todos os parceiros sociais subscriptores tinham bem presente um aspecto fundamental: que esta suspensão seria sempre temporária.
Mais, a UGT deve recordar que esta foi porventura das medidas mais penosas e com impactos mais directos para os trabalhadores, sobretudo em sectores em que a organização do tempo do trabalho determina um volume mais significativo do trabalho suplementar, existindo legítimas expectativas de que esta suspensão termine em Julho próximo.
Tais expectativas são aliás reforçadas pelo Acórdão do Tribunal Constitucional sobre esta matéria, em que a suspensão foi aceite como constitucional atendendo à ligação estreita entre a fundamentação apresentada pelo Governo, a sua necessidade face ao programa de ajustamento e ao facto de a medida vigorar apenas pelo período desse programa.
Tal quadro delineado pelo Tribunal Constitucional, de que o Governo agora se afasta, deixa assim dúvidas profundas sobre a constitucionalidade da medida agora avançada.
Temos presente que o referido Acórdão veio ainda determinar que, no termo da referida suspensão, seria insustentável uma compressão do direito à negociação colectiva como a que se encontrava estabelecida na Lei nº 23/2012, reduzindo para metade os valores negociais, o que reforça a convicção de que a manutenção deste constrangimento à negociação dificilmente será compaginável com o texto constitucional.
Por outro lado, devemos questionar qual o efectivo impacto económico desta medida por mais 5 meses para as empresas e se o mesmo, a ser relevante, deverá ser considerado mais significativo que o impacto na vida dos trabalhadores e sobre a dinamização do consumo que daí adviria.
A UGT regista o argumento aduzido pelo Governo de que esta prorrogação terá como objectivo estabelecer condições de concorrência leal entre as empresas do sector privado e do sector empresarial do estado, estas últimas abrangidas até ao final do ano pelas medidas estabelecidas no Orçamento do Estado.
Não apenas não concordamos que se continue a realizar uma nivelação “por baixo” das condições de trabalho, como o argumento apresentado suscita uma apreensão acrescida se considerarmos que os vários OE têm perpetuado no tempo medidas transitórias e excepcionais, de uma forma que consideramos abusiva.
Aliás, esta perpetuação tem-se igualmente verificado, com fortes reservas e a oposição da UGT, noutras matérias, como a do regime de renovação dos contratos a termo, mantendo condições que nos parecem carecer de fundamento e ter efeitos
perniciosos sobre o mercado de trabalho, nomeadamente em termos de qualidade do emprego.
Face a tudo o exposto, a UGT não pode senão manifestar a sua veemente oposição à prorrogação proposta, a qual deve considerar inaceitável.
Suspensão da vigência de convenções colectivas
A proposta apresentada visa estabelecer um quadro pelo qual se permite que as convenções colectivas podem ser suspensas na sua vigência ao nível da empresa, mediante acordo entre o empregador e as comissões sindicais e intersindicais, em condições similares às que se encontram estabelecidas para o lay off.
A UGT considera que a presente proposta suscita problemas diversos de ordem jurídica e prática, que não podem deixar de ser equacionados.
Desde logo, devemos questionar a legitimidade das comissões sindicais e intersindicais para celebrar tais acordos.
Com efeito, tais comissões, emanando dos sindicatos, têm competências específicas ao nível da actividade da empresa, em nada compagináveis com a legitimidade que apenas quem se encontra devidamente mandatado pela associação sindical tem para representar estas nos processos negociais.
Nesse quadro, entendemos que a proposta colide directamente com o exclusivo constitucional dado aos sindicatos no que concerne à negociação colectiva.
Mais, não podemos deixar de questionar os efeitos práticos desta proposta se atendermos a que o nosso tecido empresarial é constituído por uma esmagadora maioria de micro, pequenas e médias empresas em que inexistem tais comissões.
Mais problemas práticos suscita a proposta se considerarmos questões como a própria composição das comissões sindicais e intersindicais.
Estas são integradas por elementos de sindicatos diversos, alguns deles nem sequer subscriptores de uma dada convenção, o que não apenas reflecte claramente as finalidades diversas que presidem à sua existência mas que leva de imediato a questionar não apenas a sua já aludida legitimidade, mas ainda os efeitos sobre o universo dos trabalhadores da empresa, os quais seriam muito diversos.
A UGT considera que a suspensão de vigência de uma convenção é uma possibilidade que decorre já da legislação existente, não sendo inovadora no nosso quadro normativo ou mesmo na prática negocial, o que leva a questionar a necessidade desta proposta.
Não deixa de ser significativo que o próprio Memorando de Entendimento apenas coloque a hipótese desta alteração legislativa como uma alternativa à não implementação de uma possível redução dos prazos de sobrevigência e caducidade das convenções e não cumulativamente com esta última.
A UGT concebe como possível que, num quadro de dinamização da negociação colectiva, poderia ser entendido como pertinente que a possibilidade de suspensão das convenções fosse devidamente enquadrada, esclarecendo-se o quadro legal existente, cumprindo porém duas condições.
Desde logo, que não seja atribuída legitimidade para negociar essa suspensão por entidades que não as entidades celebrantes da convenção.
Mais entendemos que, com vista a promover novos conteúdos e a dinamização dos processos negociais, que a possibilidade de suspensão deveria ser estabelecida no quadro das próprias convenções celebradas, permitindo não apenas enriquecer conteúdos mas promover uma regulação mais específica e próxima da realidade das várias empresas pela via que consideramos dever ser privilegiada, a da própria negociação colectiva.
Sobrevigência e caducidade das convenções colectivas
Nesta matéria, e igualmente sob a égide de promover a negociação colectiva, foi apresentada uma proposta no sentido no sentido de, simultaneamente, reduzir o prazo de caducidade das cláusulas que fazem depender a cessação da vigência de uma convenção da substituição por outra e operar uma diminuição do período de sobrevigência.
A UGT não pode deixar de contestar que esta seja uma proposta que vem de facto incentivar à negociação, colocando antes uma pressão acrescida para negociar apenas sobre os sindicatos e criando o perigo de novos e indesejáveis vazios negociais.
Mais, devemos relembrar que, nesta matéria, o Memorando de Entendimento, no qual o Governo apoia a sua pretensão de operar esta alteração legal, fazia depender a redução dos referidos prazos de um estudo prévio sobre a necessidade de a efectuar, estudo que nunca foi realizado ou apresentado aos parceiros sociais.
Assim, não podemos deixar de questionar, também nesta sede, da existência de elementos sobre a realidade portuguesa ou dos nossos parceiros europeus que permitam de facto fundamentar a pertinência desta alteração e a proposta concreta de redução de prazos.
Nesse quadro, a UGT apenas entende como atendíveis propostas que contribuam para garantir a existência de uma real negociação e para promover o empenho de ambas as partes envolvidas no resultado dessa mesma negociação, de forma a obstar, conforme já referimos, à existência de vazios negociais.
A conceber-se a possibilidade de uma redução do prazo de sobrevigência, e contestando a redução proposta para apenas 6 meses, a UGT defende que a mesma teria de ser articulada com novas regras de contagem.
Com efeito, entendemos que seria cogitável um quadro em que a contagem do prazo de sobrevigência se suspenda sempre que se verifique uma interrupção mais ou menos duradoura do processo negocial (vg. 30 dias). A fim de obstar à possibilidade de nunca se vir a verificar o termo do prazo, poderia ser estabelecido um prazo máximo, o qual teria de ser, no nosso entender, superior ao prazo actualmente fixado na lei, propondo a UGT que seja de 30 meses.
Tal quadro cumpriria os objectivos que a UGT entende deverem estar subjacentes a estas propostas, promovendo uma negociação mais efectiva e um maior equilíbrio entre as partes patronal e sindical que poderia contribuir para uma redinamização da contratação colectiva.
22-05-2014